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Quando nasce uma criança, nascem uma mãe e um pai. Será?

Por: Caroline Sorgi e Camila Portella

Essa frase sempre foi, e ainda é muito citada entre as famílias no momento que uma criança está para chegar. Muitos sentimentos, muitas sensações, muitas fantasias, muitos palpites. Quando chega uma criança, uma nova configuração familiar se estabelece; a dinâmica que antes existia, modifica-se completamente, afinal, a chegada de um novo integrante leva cada um a repensar seu lugar e suas funções para dar conta do novo.

É muito comum lermos e escutarmos as pessoas ‘romantizando’ a maternidade, destacando somente os aspectos positivos desse momento tão especial, mas o fato é que não podemos generalizar, e que também há de se considerar os aspectos muito desafiadores da maternagem, ou melhor dizendo, dessa parentalidade.

Há famílias com vários tipos de configurações: mãe solo, pai solo, avô, avó, duas mães, dois pais, o que em psicanálise, entendemos ser diferente de ‘exercer a função materna ou paterna’, pois essas podem ser exercidas por qualquer uma dessas figuras, independente do gênero e laço sanguíneo. Entretanto, há muitas possibilidades de cuidado e afeto nessa rede familiar, seja qual for. O cerne familiar nos faz pensar sobre o lugar de desejo que aquela criança ocupa em cada família. Uma vez que a criança já é falada antes mesmo de nascer, é esse outro/mãe/cuidador que dará um lugar a ela no mundo por meio da inserção na linguagem. Antes mesmo de sua chegada, essa criança já é idealizada ou não pelos pais, idealiza-se o nome, o quartinho dele ou dela, o jeito, a fisionomia, a profissão. Tudo isso são projeções nossas nesse ser que está a caminho.

Mas será que tornar-se mãe e pai é um processo natural? Um dom? A resposta é: não. Quando nasce ou chega um bebê, nem sempre nasce uma mãe e um pai. Há algo que é tão exclusivo daquela relação que vai depender de vários aspectos, entre eles, o desejo desses pais, o lugar que essa criança vai ocupar, o momento do casal, e especialmente o vínculo afetivo que se estabelece com a criança. Mais uma vez, estamos falando da função materna e paterna, que vai para além dos cuidados básicos com a prole. Os pais, só se tornam pais na relação com a criança. Isso não é dado previamente, é construído.

E isso também vale para adotantes? Ora, por que não? Os desafios de uma adoção são até mais íntimos que de uma não adoção.  Precisamos nos permitir adotar o filho e ele nos adotar. Permitir estabelecer um vínculo, construir e desconstruir. Da mesma maneira que um filho biológico pode ser desejado ou não pelos pais, o filho adotivo é atravessado pelo mesmo processo.

Será que um cuidador se permitiria sentir raiva do filho? Será que podemos nos permitir sentir medo? O que fazer quando os pais não se autorizam a evocar sentimentos ditos como ruins? O que fazemos com a culpa que carregamos?

A análise com um profissional pode ser um ótimo caminho para trabalhar com a possibilidade do eu, do não eu, do outro. É possível escutar todos esses sentimentos inerentes ao ser humano, e que por isso, com os pais não seria diferente. Em análise há um espaço de potencial criativo. Um espaço onde todos esses sentimentos podem ser escutados e ressignificados de acordo com a história de cada um e junto ao analista.

 

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